domingo, 7 de fevereiro de 2016

Bendita seja a reciclagem musical

Alguns discos têm importância tão grande na carreira dos artistas que viram raridade. É o caso de “Pirão de peixe com pimenta”, que marcou a trajetória de Sá e Guarabyra. A “bolacha” gravada em 1977, pela Som Livre, traz sucessos como “Sobradinho” e “Espanhola” e mostra um estilo musical que fala de maneira cativante sobre a cultura e o cotidiano interioranos do Brasil. O trabalho da dupla também se destaca pela elevada qualidade técnica, sem deixar de ser popular. Imagina-se que qualquer cópia do “Pirão” seja guardada com muito zelo e carinho. Mas nem sempre é assim.

Alguém acredita que esse disco poderia ser encontrado no lixo? Pois foi exatamente assim que o violeiro Ricardo Vignini descolou sua cópia. “Achei este e diversos outros vinis em uma lixeira do prédio onde morava”, conta. Isso aconteceu lá pelos anos 1990, quando o músico vivia na Vila Santa Catarina, zona sul da cidade de São Paulo (SP). “É um grande disco da dupla, gravado com uma grande banda”, acrescenta. Descaso para uns, presente para outros.

O encontro de Vignini com o disco de Sá e Guarabyra aconteceu em um momento de reciclagem musical. Primeiro, porque salvou a “bolacha” de um destino cruel. Segundo, porque foi naquela época que o som digital vinha ganhando espaço e os CDs começavam a assumir o reinado dos vinis. E, em terceiro, porque o próprio Vignini estava definindo novos rumos para sua carreira. “Toquei guitarra por muito tempo, e comecei com Rock pesado. Mas minha avó sempre me falava da catira e de outras coisas da cultura musical do interior.”

Vignini descobriu que a energia buscada no Rock’n’Roll também podia ser encontrada em um ponteado de Tião Carreiro. Daí para a frente, sua carreira passou a girar em torno da viola. Mais do que um dedicado instrumentista, também se tornou um pesquisador da cultura popular do Sudeste. Inevitavelmente, foi se envolvendo com outros nomes significativos dessa praia, ou melhor, desse campo.

Bom exemplo é o violeiro Zé Helder, com quem forma o Moda de Rock, projeto musical em que fazem versões de grandes clássicos do Rock’n’Roll para viola. “A história começou com o intuito de atrair a atenção dos jovens para o instrumento e foi tomando uma proporção gigante”, diz o violeiro. Do lançamento do primeiro disco, há cinco anos, até o final de 2015, a dupla realizou mais de 300 apresentações, dentro e fora do Brasil. E andam com a agenda cheia.

No início de janeiro, Vignini e Zé Helder lançaram o disco Moda de Rock II. O Vitrola foi conferir uma das apresentações. A dupla é mesmo impressionante. Para se ter ideia da versatilidade e da criatividade da dupla, o repertório passa por Iron Maiden, Slayer, Ozzy Osbourne, Metallica, Pink Floyd, Queen, entre outros. No entanto, Vignini deixa um recado para a garotada que pretende se divertir tocando Rock’n’Roll na viola: “Primeiro tem de aprender a tocar Tião Carreiro”.

Aqui vai um vídeo de Sá e Guarabyra tocando “Sobradinho” na TV Cultura, no programa “Viola, minha viola”, apresentado na época pela saudosa Inezita Barroso.